TERCEIRA REUNIÃO
O mensageiro e as vacas que pastavam no telhado
Conforme tinha determinado Ifá, no decimo sexto dia depois da reunião em que Obará contara a historia das aboboras, os dezesseis senhores do destino se juntaram e partiram de novo em direção ao Céu dos orixás. Era a terceira reunião na casa de Ifá, no Orum, e quem mais falou foi Ejila-Xeborá, ajudado por Etaogundá. A historia que mais chamou a atenção tratava das artimanhas de um certo mensageiro muito popular de nome Exu. Antes de contar a historia, porém, valeria a pena sabermos um pouco mais sobre esse interessante personagem.
Naqueles tempos da Africa antiga, como gosta de contar o príncipe Ocanrã, um mensageiro iorubá se tornou muito famoso por suas artimanhas e pelas peças que pregava em quem quer que fosse. Seu nome era Exu e sua profissão era de levar mensagens trazer recados e recomendações e ser o portador de mercadorias e presentes de tudo quanto é especie. Ganhava um bom dinheiro, Exu, pois nunca trabalhava de graça, exigindo sempre pagamento adiantado. Apesar do dinheiro que ganhava, Exu não tinha casa. Vivia pelas ruas e estradas, dormia nas encruzilhadas. Exu estava sempre em movimento, sempre pra la e pra cá, levando e trazendo objetos e palavras.
Pois bem, contou Ejila-Xeborá, havia um homem que se chamava Babalequê, que vivia contando vantagens, inventando grandes lorotas e propalando proezas fantasiosas. Era potoca demais, era muita gabolice. O falastrão não se continha nunca. Bastava conversar com ele, dar-lhe corda, e la vinha uma de suas bravatas impagáveis.
Sua fama de mentiroso era tao grande que um dia o rei mandou chamar Babalequê e lhe disse que parasse com aquela mentirada. A ma fama do falador ja tinha ultrapassado as fronteiras do rei, fazendo rir os vizinhos, dele e do seu povo, para vergonha e desgosto do rei. Babalequê não se deu por vencido. e disse que era tudo invenção dos seus inimigos. As suas historias eram genuínas suas proezas eram as mais verdadeiras. Ele disse ao rei: “Infelizmente sempre tem um invejoso a me perseguir. Outro dia plantei uns inhames cozidos e quando eles brotaram foram dizer que era mentira. como mentira, se estava tudo la para quem quisesse ver?”.
O rei ficou furioso com a audácia de Babalequê. Que atrevimento, contar uma mentira dessas para o rei! E sem nem sequer ficar vermelho. O rei então falou: “Amanha de manha nos reuniremos em minha roça e la tu plantaras inhames previamente cozidos. Se os inhames não brotarem no prazo devido, perderas a tua cabeça”. E dispensou o falador: “Podes te retirar agora”.
Babalequê ficou desesperado, e agora? “Ai de mim, ja sou um homem morto”, choramingou, desamparado. Mas como não era homem de não se entregar facilmente, foi ao mercado e comprou algumas coisas. Saiu então a procura de Exu, que encontrou descansando numa encruzilhada, vindo de uma entrega que fizera num lugar distante. Com um sorriso ardiloso ele abordou o mensageiro: “meu compadre querido, percebo que estas cansado. Vens de longa viagem e deves estar com fome. Vem dividir comigo este almoço”. Sabendo que Exu era guloso e que jamais recusava uma suculenta refeição ele tinha comprado uma boa porcão e carne de cabrito refogada no azeite-de-dendê com muita pimenta, acompanhado de inhame assado e farofa, alem de uma garrafa de aguardente e uma quartinha de água fresca. Exu não se fez de rogado e e fartou. Comeu e lambeu os beiços. Babalequê contou que o rei o obrigava a plantar inhames cozidos, tudo por causa da intriga alheia, e que se os tubérculos não brotassem, ele teria sua cabeça decepada. “Ai de mim, já sou um homem morto”, choramingou Babalequê, desamparado. Exu, que tinha apreciado muito o almoço encorajou o amigo: “Tudo na vida tem uma saida, amigo. Podes contar comigo”.
Na manha seguinte, na presença do rei e com a companhia discreta de Exu, Babalequê abriu uma cova rasa na roça real e depositou nela alguns tubérculos de inhame que a cozinheira do palácio já tinha cozinhado. Nesse instante, Exu começou a gritar: “Olhem as vacas no telhado! Olhem as vacas no telhado do rei”. Todos se voltaram na direção do palácio dando as costas para a plantação, e contemplaram surpresos, uma visão soberba. Muitas vacas estavam em cima da casa do rei, de pe no telhado de sapé, pastando com a maior tranquilidade. Durante alguns minutos de fascinação enquanto todos estavam absortos, contemplando a espantosa cena, Babalequê abriu a cova e trocou os inhames cozidos por inhames frescos e fecundos, conforme Exu o tinha antes instruído.
Dias depois, sob a vigilância dos guardas reais, que dali não arredaram o pé os inhames brotaram verdes e viçosos. O rei não teve outro jeito e libertou Babalequê. Mas que isso, acompanhando os pedidos de desculpa, deu a ele uma grande recompensa em ouro.
Babalequê foi se encontrar com Exu na encruzilhada. agradecendo pela ajuda, deu-lhe uma boa parte do premio que recebera e então perguntou ao mensageiro: “Meu caro, como foi que colocastes aquelas vacas todas pastando no telhado?”. Este respondeu: “Que vacas no telhado, meu amigo, que historia maluca é esta? Ja estas de novo a contar as tuas mentiras?”. E foi-se embora morrendo de rir.
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A continuar….
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