Nanã, o ventre mãe de todas as gerações – senhora do portal da vida e da morte”, determinou, em caráter irrevogável, que nenhuma pessoa do sexo masculino teria acesso ao Mundo dos Mortos. Òlufón, o grande Orixá funfum, inconformado com a decisão de Nanã, não somente por ser seu esposo, mas também pela sua condição diante dos demais Orixás, resolveu contornar a situação, colocando-se a seu favor. Òlufón tinha ciência de que, ao Transpor o portal da vida e da morte, correria o risco de ficar retido no mesmo, mas, mesmo assim, seguiu Nanã sorrateiramente quando a mesma se dirigiu ao Mundo dos Mortos, aproveitando-de do descuido do portal aberto. Sem que Nanã percebesse, Òlufón observou todos os seus atos e procedimentos junto aos mortos, nada passou despercebido ante a Òlufón, a tudo ele ficou atento: a entrega das folhas, as cabaças, o instrumento que os invocava, enfim, toda a liturgia e ritual da vida, da morte. No entanto, o que mais chamou atenção de Òlufón, foram os cântigos, uma vez que, Nanã ao invés de entoá-los, gungunava. Após a realização de todos ritual, Nanã voltou ao àiyé, sem perceber que Òlufón a tinha seguido e voltado com ela do Mundo dos Mortos. Ao voltar para o àiyè, Òlufón engendrou um plano para entrar no Mundo dos Mortos e passar para sí os mesmos poderes atribuídos a Nanã. Antes de retornar, para executar seu plano, Òlufón entrou escondido nos aposentos de Nanã, apoderou-se de seu cetro e da sua coroa, colocando-a imediatamente sobre a sua cabeça e em seguida cobrindo-se totalmente com o manto preto e outro feito de palha da costa trançada em forma de rede, vestimenta essa que servia Nanã quando a mesma participava do ritual da vida e da morte. Após isso, Òlufón seguiu rumo a outra dimensão. Totalmente disfarçado com as vestes de Nanã, Bagbá Òlufón chegou ao Mundo dos Mortos, tratando logo de executar seu ardiloso plano, procedendo da mesma maneira que Nanã. Entretanto, com apenas uma exceção, ao invés de gungunar com os mortos, Òlufón falou-lhes: ” A partir de hoje, vocês obedecerão também ao meu esposo Òlufón. Os desejos e as determinações dele deverão ser cumpridas. Sempre que ele fizer algum pedido, vocês deverão atendê-lo”. Enquanto Òlufón executava seu astucioso plano no Mundo dos mortos, do outro lado da dimenção, Atioró, o pássaro sagrado que fica ostentado sobre o cajado de Nanã, não cessava de gritar, indo e voltando ao mundo dos mortos. Nanã, ao perceber ao perceber que algo de anormal estava acontecendo no reino dos Mortos, seguiu imediatamente para o local, chegando justamente no momento que Òlufón terminava seu habilidoso plano. Nanã tentou de todas as maneiras desfazer a trama de Òlufón mas todos os seus esforços foram inúteis, os Egúns não reconheceram a sua voz, pois ela não falava com eles antes, apenas gungunava. Irada com o procedimento de seu esposo, Nanã pronunciou-se: Não tenho como desfazer sua trama, serei obrigada a compartilhar contigo o segredo da morte, portanto, a partir de hoje, serás aquele que tocará o cajado/Oparun por três vezes consecutivas sobre a terra, prenunciando o fim de um ciclo, isto é, a morte de um ser humano.
Não satisfeita e ainda enraivecida, Nanã setenciou: Òlufón, em virtude de tua afronta, de hoje em diante, carregarás para sempre sobre teu ombro esquerdo o pássaro Atioró. Aceitarás, tal como eu, somente oferendas de animais do sexo feminino deixando assim de aceitar unicamente animais portadores de sangue branco.
Texto adaptado: Fernando D’Osogiyan